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terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

OS COELHOS NO PALHEIRO DO TI RELA

 MEMÓRIAS DA MINHA ALDEIA “OS COELHOS NO PALHEIRO DO TI RELA”



A gente lembra-se de cada coisa.
Hoje quando fui fazer a minha caminhada matinal passei ao que agora chamamos Monte Verde, mas que, na verdade, continua a ser conhecido por todos nós como o Monte do Ti Rela.
em outros textos referi a minha relação de amizade e proximidade com esta família, nomeadamente com o recentemente falecido Manuel Rela, com quem além da amizade desde crianças tínhamos a afinidade da idade, já que apenas 5 dias nos separavam.
Nesses tempos a debulha dos cereais era feita por máquina debulhadoras fixas e a palha daí resultante era carregada a granel em carroças previamente apetrechadas para tal fim com uma rede própria, onde muitas vezes era precioso o trabalho dos miúdos, cuja tarefa consistia em calcar a palha dentro da rede, sendo posteriormente armazenada nas célebres serras da palha ou nos palheiros, trabalho penoso a que ainda assisti e colaborei.
A parte do monte virada a poente era destinada à habitação, na parte de trás virada a nascente eram as cabanas e o palheiro, nessa época os coelhos bravos não eram propriamente uma praga, mas existiam em grandes quantidades, às vezes quase coabitando com o pessoal que vivia nos montes.
O palheiro do Ti Rela não era mais que uma dependência de 14 ou 15 metros quadrados comunicando com o exterior por uma porta de madeira com um buraco em baixo a que se chamava gateira, que tal como o nome deixa intuir servia para os gatos poderem entrar e sair dando dessa forma caça aos ratos. Já que a gateira era mesmo à sua medida, um ou outro coelho mais afoito passou também a resguardar-se no palheiro ou, porque se reproduziram ou, porque uns foram convidando os outros, eram já muitos os coelhos que tinham como esconderijo o palheiro do Ti Rela, facto esse que não passou desapercebido ao Manel.
Ó! Pessoal um dia destes temos que ir apanhar uns coelhos para o petisco lá ao meu palheiro!!
A equipa já não me recordo bem, mas devia ser a mesma de sempre Eu, o Manel, o Armando Oliveira, o Relâmpago, o Zip e provavelmente o Chico Moca, mais que a aliciante do petisco, o que mais nos movia era a parte hilariante da questão, já que antevíamos que não devia ser nada fácil apanhar os coelhos à mão no meio da palha.
O palheiro, à semelhança de quase todos os palheiros, além da porta com postigo e gateira, não, possui qualquer outra abertura que permitisse a entrada da luz, munidos com uns ramalhos de azinho, resgatados da meda da lenha e
depois de tapada a gateira entramos todos de rompante para dentro do palheiro, aqui de pilho além te ganso, não tardou nada que fruto do pó da palha a visibilidade lá dentro fosse completamente nula, a confusão era total com
verdascadas aleatórias em todos os sentidos, recordo o saudoso Armando Oliveira que dizia, PORRA ORIENTEM-SE LÁ QUE ESTOU FARTO DE LEVAR VERDASCADAS E NÃO APANHEI NENHUM COELHO!!!
Com três ou quatro coelhos para o petisco, saímos de lá cuspindo palha e como croquetes acabados de passar por farinha.
Continuo a pensar que todos aqueles que nascemos e crescemos na ruralidade de uma pequena aldeia de província fomos, na verdade, uns privilegiados.
Texto Isidro Pinto
Para o Manuel Rela e o Armando Oliveira, os meus amigos e companheiros desta e de muitas outras aventuras, que Deus tenha as suas almas em eterno descanso.

"Texto e foto Isidro Pinto"