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sábado, 9 de janeiro de 2021

A MOURA ENCANTADA E O BEIJA ROSAS DE MONSARAZ

 

A lenda da moura encantada e do beijarosas de Monsaraz 




Há muitos anos, ainda a moirama era tolerada no seio da cristandade devido à falta de povoadores nas terras do sul de Portugal, numa noite no início do verão, o barbeiro da Vila de Monsaraz, chamado Isidoro Duarte, como quase todos os montersarenses, devido aos grandes calores, estava deitado numa esteira de buinho à porta de sua casa que, também era  a barbearia, quando pela noite dentro foi acordado pelo tropel de cavalos! Esta situação acontecia muitas vezes com o regresso ou saída dos cavaleiros do regimento aquartelado no Castelo de Monsaraz, mas naquela noite foi diferente! 

Do lugar onde estava deitado abriu um olho e viu que eram apenas dois cavaleiros que pararam junto ao Castelo, perto do barbeiro, o da frente chegou montado num lindo cavalo branco e trazia à garupa uma rapariga muito linda e o cavaleiro de atrás, com aspeto de ser seu criado segurava à sua frente um cofre! Apearam-se ambos e enquanto o senhor ajudou a rapariga a apear-se o outro colocou o cofre no chão junto dela!

A menina encostou-se à parede do Castelo e o senhor com aspeto de muita tristeza, proferiu as seguintes palavras: - Minha filha ficas aqui encantada até que neste lugar surja uma roseira com lindas rosas vermelhas, uma dessas rosas és tu que, ao ser beijada por um homem que aqui há-de vir, serás desencantada e ele recebe o tesouro que está neste cofre, salpicou-a com um líquido que trazia numa garrafa e naquele momento desapareceu tudo! 

O barbeiro Isidoro, percebeu que eram mouros, assistiu ao encantamento da moura, ficando a saber a chave do desencantamento, não se moveu na sua esteira até ao desaparecimento dos mouros, por fim, sentou-se e deu várias chapadas na cara repetindo em vós alta: - Eu estou acordado, isto não é um sonho até que adormeceu! De madrugada quando acordou, já passava por ali muita gente a caminho do trabalho e ouviam-no com aquela lamúria, mas não percebiam nada e seguiam! 

A partir dessa noite, o barbeiro passou a ser uma pessoa diferente, só via o encantamento e sonhava ser rico, enquanto cortava cabelos ou barbas repetia alto: Eu estava acordado, não foi um sonho! Os clientes riam e alguns  que tinham mais confiança com ele, respondiam: - Oh Isidoro, então querias cortar-me o cabelo e a barba a dormir? Ainda me cortavas o pescoço, homem! Ele lá disfarçava e dava uma justificação atabalhoada, mas em Monsaraz diziam que ele não devia andar bom da cabeça, porque falava sózinho coisas sem sentido! 

Passaram alguns meses e o Isidoro começou a dirigir-se, quase diariamente ao lugar onde se tinha dado o encantamento da moura na esperança de lá encontrar a roseira a nascer, mas já passava mais de um ano e não havia sinais de nenhuma roseira, então pensou que, talvez a dita roseira tivesse de ser lá plantada, como as roseiras de rosas vermelhas eram escassas começou por perguntar aos clientes onde as podia encontrar e que pudesse colher algumas estacas, para plantar em Monsaraz, porque gostava muito de rosas vermelhas! Assim, foi sabendo o que precisava de saber! 

Quando chegou o inverno, na melhor altura de plantar as estacas de roseiras, o barbeiro Isidoro com o disfarce de cortar cabelos pelos Montes das herdades deslocou-se a todos os lugares onde lhe tinham dito que havia roseiras de rosas vermelhas, percorreu o Concelho de Monsaraz e voltou com algumas estacas de roseiras para plantar no lugar do encantamento, mas nenhuma vingou! 

No ano seguinte repetiu o mesmo percurso e alargou a sua ação para outros lugares onde lhe tinham dito que havia roseiras com rosas vermelhas, foi à Vila de Mourão e percorreu os caminhos dos Montes das herdades das terras de Capelins, quando voltou, plantou algumas estacas no mesmo lugar, mas plantou outras por outros lugares! As que plantou no lugar do encantamento não vingaram nenhuma, mas as outras vingaram todas e devido ao tratamento que ele lhe fazia, depressa se fizeram grandes roseiras!  

O Isidoro já tinha roseiras em Monsaraz para transplantar estacas, para o lugar do encantamento, mas as que vingavam, no verão mesmo bem regadas, secavam-se! 

 Algumas das roseiras que não transplantou, passados alguns anos começaram a dar lindas rosas vermelhas e o barbeiro Isidoro na esperança que não fizesse diferença ser mais ao lado do Castelo, começou a ir todas as manhãs a beijá-las uma a uma, mas não tinha nenhum resultado! Os montesarenses que passavam não percebiam o que era aquilo, achavam muito estranho e perante aquele  cenário, deram-lhe logo o apelido de beijarosas!

O Isidoro passou a ser conhecido pelo barbeiro beijarosas, ele sabia disso mas não se importava, queria era ser rico, mas para isso acontecer só precisava de uma roseira no lugar que só ele sabia! 

O barbeiro Isidoro nunca desistiu e passou o resto da sua vida a plantar roseiras no lugar do encantamento e a beijar rosas vermelhas por todo o lado, mas acabou por ir prestar contas a Deus e não conseguiu o desencantamento da moura, porque durante a sua vida não nasceu nenhuma roseira naquele lugar junto ao Castelo, antes de partir contou tudo a um irmão que, não lhe deu crédito nenhum, pensou que tivesse sido um desequilibrio mental e não deu importância ao segredo!

Passados cerca de dois anos do desaparecimento do beijarosas, nasceu uma roseira junto ao Castelo, cujas raízes vinham de dentro das paredes e crescia a olhos vistos, depressa começou a dar lindas rosas vermelhas, toda a gente na Vila de Monsaraz a admirava e diziam que nunca tinham visto rosas vermelhas tão lindas, mas como pertencia ao Castelo, logo ao Alcaide Mor, então ninguém se atrevia a aproximar-se dela!

No ano seguinte, o Castelo de Monsaraz entrou em obras, porque tinha algumas torres e partes do pano das muralhas já em ruínas e a roseira das rosas vermelhas foi acusada de ter lançado as suas raízes nas paredes e de contribuir para a sua degradação, sendo condenada à sua imediata erradicação daquele lugar! 

Depois das obras concluídas as raízes da roseira ficaram entre o pano duplo da muralha e ela nunca mais viu a luz do dia, não havendo roseira não há rosas, não havendo rosas, não há desencantamento, não havendo desencantamento a moura continua encantada, estando aprisionada naquele lugar com o tesouro junto dela e dizem que, nas lindas noites de luar naquele lugar em Monsaraz a podem ouvir chorar.  

Fim 

Texto: Correia Manuel 

Fotografia: Isidro Pinto



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