O BUNDA E O MEDO DA TORRE DAS FEITICEIRAS
Monsaraz era á época e á semelhança de quase todas as vilas
acasteladas campo fértil para a imaginação dos medos e bruxarias, era frequente
dizer-se que aparecia um medo aqui ou acolá, andava o meu amigo António Morais,
conhecido por todos nós pelo Bunda como ajuda do alavão (conjunto de tarefas
inerentes a ordenha e fabrico dos queijos) no monte do Xerez e como á época já
namorava a ti Rosa eram frequentes as vindas a Monsaraz, o trabalho era de sol
a sol o que implicava que tudo o resto se fazia de noite.
Na ladeira da Barca e quase a
chegar ao S. Cristóvão, era o sítio onde se dizia que aparecia um medo, nessa
noite, depois do namorico passou ainda pela taberna e deixou que a noite fosse
um pouco mais avançada que o normal, afinal era um jovem e aos jovens nada lhe
mete medo, passou por casa dos pais e pegou o pequeno alforge com o pão que
havia de levar para a malhada, alforge ao ombro bordão de zambujo na mão e um
ultimo olhar ao pequeno relógio de algibeira que lhe havia ofertado o seu avô
no dia dos seus dezoito anos, quase meia noite, não era medroso, mas lembrou-se
que era a hora que diziam que aparecia o medo por de trás do castelo, um
respiro de jovialidade e pensou para si á!!!! Balelas, ele que apareça que
ainda leva com o zambujo no lombo. Saiu pela porta de Alcova e passando por
detrás do Castelo, apanhou a ladeira da Barca que o havia de levar ao S.
Cristóvão e posteriormente ao Furado, rumo ao monte do Xerez, a noite escura
como breu não deixava ver um palmo á frente do nariz, estava agora já na
ladeira da Barca e quase a chegar ao S. Cristóvão, quando, como se alguém lhe
tivesse passado uma rasteira ou apanhado os dois pés ao mesmo tempo se
estatelou completamente ao comprido, o alforge saiu-lhe do ombro e o bordão
quase lhe caia da mão, tateando no escuro, levantou-se apanhou o alforge e ó
pernas para que te quero, não corria porque a escuridão não o deixava mas
tentava sair dali o mais depressa possível, porque afinal aquela coisa do medo
se calhar era verdade, alguém o tinha derrubado. O caminho até ao monte foi
feito em tempo recorde. Não contou a ninguém, mas jamais lhe saía da cabeça, no
dia seguinte, necessitando de ir a Monsaraz e terminada a ordenha das ovelhas
da manhã, foi o Bunda falar com o Bolas (encarregado dos queijos).
- Ó ti Bolas vossemecê hoje
devia deixar-me sair mais cedo para eu ir a Monsaraz.
- Outra vês Tonho, olha que
aquilo não se acaba dizia o Bolas, deixando escapar algum ar malicioso fazendo
entender que se referia ao namoro do Bunda
-Não senhor não é isso é que
queria ir ao Telheiro á dos Patinhas tirar medida para umas botas, e queria
chegar por ali ainda de dia, dizia o Bunda, já mais iria deixar entender que na
noite anterior se ia borrando todo com o medo da Torre das Feiticeiras.
Convencido o Bolas lá consegui-o a solta (termino do dia de trabalho) um bocado
antes do pôr do sol.
Alforge ao ombro, bordão de
zambujo na mão, tomou a estrada do monte que o havia de levar a Serra do Xerez
e posteriormente a apanhar a Ladeira da Barca. Era um fim de tarde primaveril,
onde os cheiros se confundiam e a vida fervilhava á sua volta, ouviam-se cantar
as perdizes e os coelhos corriam á sua frente a esconder-se nos covais, aqui e
ali um outro mocho empoleirado em alguma pedra mais alta, esperando que
chega-se o anoitecer. Para traz haviam ficado já a Vinha das Soalheiras e a
Cova da Mulher, caminhava já na Ladeira da Barca quando se deu conta que embalado
por tudo o que o rodeava, se esqueceu momentaneamente do motivo da sua ida a
Monsaraz, e do Medo da Torre das Feiticeiras, á medida que se aproximava do
lugar dos acontecimentos, voltavam a si os receios e as perguntas sem resposta,
que coisa teria sido aquela? Que de uma forma tão limpa o derrubara puxando-lhe
os dois pés ao mesmo tempo e que ruído teria sido aquele? Que se assemelhava ao
restolhar de algo que se afastava. Não era medroso! Mas tinha que admitir que
ontem lhe tinham feito meter as cabras no curral, avistava já a Torre das
Feiticeiras e pelas suas contas não devia estar longe, do lugar onde o medo lhe
apareceu, apanhou o bordão com mais firmeza, levantou-o, deixando que descaísse
sobre o ombro, ficando assim a meio caminho de dar uma boa bordoada se fosse
necessário, a atenção era agora redobrada, tentando encontrar uma pegada ou
algo que o pudesse ajudar a esclarecer tudo aquilo, nada, a não ser um burro
branco, que pastava num dos currais junto á ladeira, que nesta zona é
delimitada por pequenos muros de pedra, foi ao aproximar-se mais que se deu
conta que havia uma corda atravessada na ladeira, alguém tinha prendido um
burro no curral de cima, mas este saltara os muros, para o curral de baixo
fazendo com que a corda ficasse em tenção a atravessar a ladeira.
Falava agora o Bunda sozinho. Á
BURRO DUM LADRÃO QUE ME PREGASTE UM CAGAÇO DE MORTE. estava para ele explicado
o medo da torre das feiticeiras.
OBRIGADO BUNDA OXALA O TEMPO
NOS DÊ TEMPO PARA CONTARMOS MUITAS ESTÓRIAS
"Autor texto e fotos Isidro Pinto" para Monsaraz a Caminhar
"Autor texto e fotos Isidro Pinto" para Monsaraz a Caminhar
Sem comentários:
Enviar um comentário