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sábado, 13 de fevereiro de 2021

O RAMPELHÃO E OS GAMBOZINOS

 O RAMPELHÃO E OS GAMBOZINOS


Era normal principalmente nas grandes herdades, onde os miúdos chegavam por volta dos 10 ou 11 anos como ajudas de qualquer moral pregarem-lhe partidas, o que era visto à época como uma forma de praxe ou iniciação à vida do campo, muitos eram os que carregavam enormes pedregulhos, pensando tratar-se da pedra de afiar picaretas ou algo parecido, ou até em alguns casos ir aos Gambozinos, que na prática não é nada, nem ninguém sabe o que é, mas cujo objetivou era enganar os miúdos, e deixa-los de noite sozinhos no campo.
Tinha o Rampelhão, chegado ao monte do Xerez como ajuda de Ti Manel Palrrusso, moral das éguas, nesse tempo e para os trabalhadores contratados vivia-se no monte das herdades, sendo a cama uma tarimba junto ao gado que lhe estava destinado, e os serões passados na casa da malta que eram de alguma forma centros de socialização, e aprendizagem para os mais novos, foi aí, que um dia alguém se lembrou e disse, Ó! Pessoal! Olhem lá que um dia destes temos que levar o Rampelhão aos Gambozinos, sempre colaborante logo respondia o rapazola VAMOS EMBORA.
Chegou o dia, ou melhor, a noite, em que depois da ceia, tudo se conjugou para irem aos gambozinos com o Rampelhão, foi o Bolas como um dos mais brincalhões que tomou a iniciativa e disse, Ó! Rampelhão vai lá à cabana das éguas, buscar uma saca vazia daquelas da ração, que é para irmos aos gambozinos, traz uma das maiores que é para caberem muitos, e tu ó Morais arranja lá aí o lampião para termos luz para o caminho.
Estava uma típica noite de inverno, escura como breu onde apenas a difusa luz do lampião rasgava a escuridão dos campos. Saíram do monte, pelo lado direito, contornando-o na direção da tapada do Xerez, que tinha na extremidade sul e na parte mais baixa ao nível do solo uns agulheiros na parede, (buracos pequenos) cuja função era deixar sair a água impedindo que ela se acumulasse na tapada.
Já estamos perto dizia o ti Bolas! Ó! Rampelhão, agora quando chegarmos põe a saca no buraco e ficas aí à espera, nós vamos bater os gambozinos, dito e feito o bom do Rampelhão posicionou a saca, de maneira que esta cobrisse o buraco e lá ficou à espera dos gambozinos, os outros, a caminho do monte e para que o engano parecesse mais real lá iam gritando e batendo numas latas que tinham levado consigo, estariam já quase a chegar ao monte e começaram a ouvir o Rampelhão gritando a plenos pulmões JÁ CÁ ESTÁ UM – já lá está um? O que é que o gaiato grita dizia o ti Bolas? Ó ti Bolas ele diz que já lá tem um, dizia o Morais, cala-te rapaz, os gambozinos não existem dizia o Ti Bolas, está bem! mas ele diz que têm lá um, respondia o Morais, um pouco mais velho que o Rampelhão, mas com a ingenuidade própria dos miúdos que cresciam à pressa para se fazerem homens. Ele deve é estar a borrar-se todo de estar ali sozinho no meio do campo, vamos pró-monte que ele há-de lá aparecer dizia o Bolas. Não tardou muito apareceu o Rampelhão de saca às costas, todo contente exclamando TENHO AQUI UM, e ainda apanhei um belo cagaço com outro que me passou por debaixo das pernas, dá cá a saca dizia o Bolas, que continuando a apertar a boca da saca para que nada saísse foi dando largas à imaginação, o que é que ele aqui terá? Algum gato-maltês desses que andam aqui à roda do monte, ou alguma ratazana das cabanas, ou até algum saca rabos daqueles que costumam pela calada da noite vir ás galinhas, fosse o que fosse, destas espécies não podia correr o risco de meter a mão dentro da saca, era arranhadela ou mordidela segura, foi aos poucos aliviando a pressão das mãos, sobre a boca da saca e com todo o cuidado possível ia espreitando para o seu interior, tragam lá prá qui, o candeeiro, a ver se eu consigo ver melhor, com a luz mais próxima e a abertura da saca um pouco maior fez-se luz nos seus olhos e exclamou, ENTÃO O CABRÃO DO GAIATO NÃO APANHOU UMA LEBRE! Amanhã temos feijão com lebre, logo o ganhão das parelhas, respondia isso era melhor com batatas que dava para todos, outra voz se levantou e disse, pois, nem com batatas, nem com feijão, ó Morais ajuda lá o gaiato a tirar as tripas à lebre e pendurem-na aí na madre, dentro de uma saca por mode das moscas, enquanto se virava para o Manel Palrrusso e dizia ó Manel! Amanhã dás a solta (fim do período diário de trabalho) mais cedo ao João para ele ir a Monsaraz levar a lebre à mãe, era a voz de autoridade, mas respeitada ali por todos do Ti Tonho Caeiro, feitor da herdade que até ali tinha estado calado. O ÚLTIMO A RIR É O QUE RI MELHOR, LÁ VEIO O RAMPELHÃO NO OUTRO DIA A MONSARAZ LEVAR A LEBRE À MÃE.
“Texto Isidro Pinto
" Foto: Net"

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